Pronunciamento

Moacir Sopelsa - 066ª SESSÃO ORDINÁRIA

Em 13/08/2009
O SR. DEPUTADO MOACIR SOPELSA - Deputado Professor Grando, quero pedir desculpas a v.exa., mas é que eu gostaria de ter tempo para concluir o meu pronunciamento.
(Passa a ler.)
"Sr. presidente, colegas deste Parlamento, senhoras e senhores, tenho feito seguidas críticas à denominação que vem sendo veiculada na mídia sobre a nova gripe, que tanto vem deixando a nossa população apreensiva.
Reconheço que é um vírus de rápida propagação, motivo para preocupação dos agentes de saúde, até porque vidas já se perderam, e por uma só vida é preciso redobrar esforços em busca da cura para essa doença.
Especificamente sobre o nome popular que ganhou a gripe A, consagrada como sendo a gripe suína, quero retratar tópicos, deputado Reno Caramori, de um aprofundado artigo publicado no conceituado site Observatório da Imprensa, pelo jornalista Fernando Barros.
Senhoras e senhores, Barros abriu seu artigo lembrando que lutamos muito para conquistar o direito de livre expressão, mas logo diz que o direito à informação aumenta a nossa responsabilidade. Diz o jornalista que a 'informação sem chancela, sem origem definida, sem cuidados jornalísticos, amplifica e transforma as informações produzidas pelos veículos convencionais. O risco ainda é maior quando vivemos uma nova era, da nova informação instantânea, que muitas vezes é difundida sem maior preocupação, sem ser checada.
A gripe A pode ser considerada a primeira pandemia da história monitorada em tempo real. A gripe dita suína traz muitos ensinamentos e deixa sensíveis as perigosas armadilhas do processo de comunicação no século XXI.
É possível que esteja em jogo talvez até mesmo o jornalismo em si, pelo menos na forma que o conhecemos. A gripe A provou que a mídia está exponencialmente mais ágil, mais poderosa e influente. Os veículos formadores de opinião estariam tornando-se agentes diretos, conscientes e ativos de transformação da sociedade.
Sobraram perguntas: até que ponto a informação repetida e multiplicada várias vezes ultrapassa a fronteira do jornalismo para visitar as mais perigosas áreas do campo do marketing? Debatemos suficientemente essas questões? A imprensa está preparada para essas transformações? Existe gente nas redações em quantidade, preparo e grau de experiência para fazer frente aos novos desafios? A edição reflete a complexidade da sociedade, seus diversos pontos de vista?
A questão da escolha do nome gripe suína e dos critérios que nos fazem pensar sobre a diferença que separa o papel de prestar o serviço da informação e o de promover o espetáculo e provocar pânico desnecessário deve ser bem analisada. O momento zero dessa crise de qualidade de informação, em escala planetária, está localizado na Organização Mundial da Saúde - OMS -, onde, no final de abril, uma entrevista chancelava o nome gripe suína.
Criou-se uma marca, logo depois reverberada com tal intensidade e tamanha repetição que se acabou transformando em aterrorizante ameaça. Três dias depois, a Organização Internacional de Saúde Animal - OIE - emitia nota oficial condenando a expressão gripe suína. Lembrava que todos os outros nomes de influenzas foram apoiados na geografia: gripe espanhola, gripe asiática, gripe de Hong Kong. Ora, o nome das doenças tem a função social de alertar a população, de indicar o tipo de prevenção a ser adotado.
Para a população, gripe sugere uma doença de contágio entre humanos. Deve-se, portanto, evitar aglomerações, lavar as mãos, etc. E o nome gripe suína consagra uma inexistente conexão entre a doença e a carne, uma sugestão para que se evite o consumo do produto. Ou seja, um estímulo ao erro. Uma informação de má qualidade.
No caso da vaca louca, por exemplo, a carne bovina era o agente direto da contaminação. No episódio atual, todas as autoridades de saúde concordam que a carne suína não é nem nunca foi o elemento transmissor da gripe. E é por isso, e não por uma motivação gratuita, que a OMS passou a condenar o uso do nome gripe suína. E é por isso que é injustificável que a carne suína seja vítima de um massacre midiático, injusto e de dimensões inéditas. Um movimento claramente fincado no campo do marketing negativo, no qual não se consegue perceber o benefício auferido pela população.
O fato é que a OMS voltou atrás, o ministério da Saúde voltou atrás, a CNN, os jornais Wall Street, La Reppublica, Corriere della Sera e El País voltaram atrás. Mas isso não aconteceu com boa parte da mídia, mesmo diante da explicação de que as influenzas são sempre um mix de vírus. Será que não é importante discutir aprofundadamente esse assunto?
A escolha infeliz do nome veio junto com a maior cobertura sistemática on line e ao vivo registrada nas últimas décadas. Fica a impressão clara para a população de que a gripe A é uma avassaladora ameaça à sociedade. A doença é real, seus malefícios são inegáveis e o estado tem a obrigação de proteger a população. Mas será que a imprensa questionou suficientemente quais foram as reais motivações de Yurgen Schlundt, diretor de Segurança Alimentar da OMS, que sustentou o nome gripe suína durante dez dias, alegando que os pedidos no sentido contrário estavam sendo feitos por produtores, como se estes fossem verdadeiros facínoras, um grupo de lobby desapegado do interesse social?
Quando a OMS voltou atrás, o nome já estava consolidado na mídia mundial, e nós mesmos sabemos o quanto é difícil para um veículo retroceder depois de criado um verdadeiro ícone de comunicação entre ele e seu público. O nome foi chancelado e cristalizado a partir de notas oficiais de um ente público internacional, depois obrigado pelos fatos a recuar, sem que a mídia questionasse esse processo.
O sr. Yurgen foi inexplicavelmente além: soltou uma nota recomendando que não fossem comidos animais suínos mortos naturalmente. Isso nunca aconteceu. Há várias décadas os organismos de controle sanitário recomendam isso, em qualquer circunstância, para qualquer animal. Mas no atual contexto, parecia uma ponte direta entre a carne e o vírus, o que não era verdade. Por ordem da direção geral da OMS, o senhor Yurgen teve que retirar a nota por insuficiência técnica. Mas o assunto foi marginalmente tratado e explicado pelas diversas mídias.
Essa gripe é uma doença particularmente ameaçadora? Apresenta taxa de mortalidade diferenciada? A ciência não tem como a controlar? Se acreditarmos no que diz a OMS e no que está nas orientações do site do ministério da Saúde, a resposta para essas perguntas é não. É importante frisar que na gripe comum a maioria dos casos apresenta quadro clínico leve, e quase 100% evoluem para a cura. Isso também ocorre na nova gripe. Em ambos os casos, o total de pessoas que morrem após contraírem o vírus em todo o mundo é, em média, de 0,5%.
É bem verdade que isso pouco importa para quem perde um familiar. Ou seja: trata-se de uma gripe com grau de mortalidade semelhante ao da gripe comum; alastra-se com impressionante velocidade, como a gripe comum; no Brasil, ainda segundo o ministério da Saúde, parte expressiva dos pacientes que faleceram apresentava quadro anterior de outras doenças; com o fim do inverno, a gripe A tende a refluir, como de resto acontece normalmente com as gripes; em breve deve surgir uma vacina específica, na Austrália, por meio da Fiocruz, ou seja, os brasileiros atravessarão o próximo inverno bem mais protegidos.
Infelizmente, o fato é que no maior site de buscas na internet já se encontram quase dez milhões de registros da gripe suína, que estreou em abril. A doença está-se transformando no fato social do ano, com repercussões econômicas definidas e inegáveis consequências políticas. Em nenhum momento deve-se minimizar a importância do problema.
Assistimos à mobilização de recursos em torno de um mal real e contra o qual a sociedade tem que ser protegida, mas caracterizadamente menos pernicioso e letal do que um rol considerável de outras doenças que jamais receberam cobertura sequer parecida. O problema é que, numa sociedade onde a informação dobra a cada quatro anos, em que os meios tecnológicos multiplicam o próprio alcance e potência em tempo muito menor, tudo indica não se está conseguindo antecipar a qualidade da informação. E do outro lado dessa história existe gente real, de carne e osso, que paga impostos e trabalha sem direito a fim de semana. Uma comunidade de cerca de um milhão de brasileiros, distribuídos na produção, no processamento e na comercialização de carne suína, que faz do Brasil o quarto maior produtor e exportador mundial.
Estamos falando da carne mais consumida no mundo, 40% do total do que a humanidade consome, segundo a FAO, que tem a média por pessoa na Europa de 45kg por ano, contra 13kg no Brasil, onde prevalece um histórico preconceito.
O professor Luiz Martins, do Departamento de Comunicação da UnB, questiona: será que estamos diante de um pânico irracional similar ao provocado pela Guerra dos Mundos, a história que fascinou os norteamericanos em 1938, num programa de rádio que narrava a invasão da terra por seres de outro planeta e que fez milhões de ouvintes acreditarem que o pânico fictício era realidade?
O certo é que agora cada computador é um jornal. Em outras palavras: se não corrermos com esse debate, não vamos conseguir contar os mortos pelo caminho. A democratização da informação é um bem conquistado pela humanidade. Talvez nem mesmo MacLuhan acreditasse que sua famosa frase se transformaria numa verdade tão brutal e literal.
O jornalista Fernando Barros encerra o artigo, do qual compilamos trechos, dizendo: 'Nesta nova fronteira, o papel dos jornalistas é lutar pela preservação da qualidade da informação, onde se destaca, como patrimônio básico, a clareza e a identificação de sua origem. Cabe aos profissionais de imprensa aprender a usar as novas tecnologias para ajudar a construir o futuro, mas sem deixar de preservar valores forjados num tempo onde o tempo não era ainda a essência das coisas'."
Trazemos, deputado Silvio Dreveck, essa nota desse jornalista para mostrar que temos que ter, sim, cuidado com a doença. Em muitos municípios já existe pânico, e trago essa nota também para mostrar que não é em cima de uma classe, de um setor produtivo importante para o Brasil e para o mundo que se deve divulgar o motivo de uma doença.
Quero pedir, mais uma vez, escusas ao amigo e companheiro deputado Professor Grando, porque achei que não conseguiria concluir o meu pronunciamento em 17 minutos.
O Sr. Deputado Décio Góes - V.Exa. nos concede um aparte?
O SR. DEPUTADO MOACIR SOPELSA - Pois não!
O Sr. Deputado Décio Góes - Eu queria parabenizá-lo pelo seu depoimento e dizer que acho que esse é um momento que exige muita responsabilidade, muito bom senso e muito equilíbrio para não induzirmos a população ao pânico.
O nome da gripe tem trazido consequências muito danosas para a suinocultura, que não tem nada a ver com a situação. Ela chegou a ter quedas de 75% na venda. Imaginem, é um setor que já está em crise, e soma-se uma crise em cima da outra. Além disso, é um setor importante para a economia catarinense e que vem sendo judiado dessa forma.
Nós chegamos a pedir aos governos estadual e federal, através de uma indicação da Assembleia, que fizessem campanhas a fim de esclarecer esse fato à população, para ela poder consumir carne suína sem medo. E isso é importante, inclusive, para o desenvolvimento do nosso estado.
Muito obrigado e parabéns!
O SR. DEPUTADO MOACIR SOPELSA - Era o que tínhamos a dizer, sr. presidente e srs. deputados!
Muito obrigado!
(SEM REVISÃO DO ORADOR)