Pronunciamento

Luciane Carminatti - 098ª SESSÃO ORDINÁRIA

Em 30/10/2014
A SRA. DEPUTADA LUCIANE CARMINATTI - Sr. presidente, srs. deputados, sras. deputadas, professores de Blumenau e de Gaspar, que estão acompanhando nossa sessão neste momento, quero cumprimentar todos os alunos presentes e dizer que é muito bom ver as crianças já iniciar sua vida escolar compreendendo os espaços de decisão, de formulação de leis e de fiscalização.
A minha manifestação hoje se refere a algo que tem sido falado, especialmente a partir de segunda-feira desta semana, que é o Decreto n. 8.234, de 23 de maio de 2014, que institui a política nacional de participação social e o sistema nacional de participação social, que alguns menos esclarecidos ou talvez com uma intenção já preconceituosa têm chamado de decreto bolivariano.
Quero chamar atenção, porque creio que um dos grandes males do nosso país é a desinformação. As pessoas ouvem, reproduzem sem analisar de fato o que estão dizendo e a veracidade das informações. Não é porque a Rede Globo ou uma emissora de TV anuncia num jornal ou um comentarista fala que seja a única versão dos fatos ou a versão verdadeira. Essa capacidade crítica de analisar os fatos e compreender o que está em jogo é papel da educação, é papel do cidadão brasileiro.
Esse decreto que tem sido tão discutido esta semana coloca, na verdade, como pano de fundo quem quer um país mais democrático, mais participativo ou menos democrático, menos participativo. Não tem nada a ver com interferência aos conselhos, não tem a ver com retirar poder do Parlamento.
Nos 22 artigos do decreto, os quais analisei um a um, em nenhum momento são colocados em risco os Poderes constituídos. Esse decreto vem justamente para sinalizar que o cidadão organizado ou de forma individual tem o direito de expressar a sua opinião e que os gestores públicos precisam ouvir essa opinião antes de formular as políticas públicas. O decreto é tão bom que garante várias questões. E vou destacar aqui algumas.
Primeiramente, esse sistema tem que garantir na formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação dos programas algumas diretrizes. Esse decreto precisa considerar as ideias, as opiniões e as deliberações da sociedade civil, dos conselhos de políticas públicas, das comissões de políticas públicas, das conferências nacionais, da ouvidoria pública federal, das mesas de diálogo - nós sabemos o quanto temos pautas que precisam ser tratadas, como é o caso das 40 horas, como é o caso do fator previdenciário, temas polêmicos que numa mesa de diálogo, onde estariam presentes governo, sociedade civil de forma paritária ou empregados, empregadores e governo, de forma paritária, discutiriam esse tema -, fóruns interconselhos, audiências públicas, consultas públicas e ambientes virtuais de participação social.
É objetivo dessa política nacional, entre outros, consolidar a participação social como método de governo. Por que o governo não quer a participação social? O que é que um governo tem a perder com a participação social? Eu não consigo compreender.
(Passa a ler.)
"Art. 4º São objetivos da PNPS, entre outros:
[...]
II - promover a articulação das instâncias e dos mecanismos de participação social". Ou seja, para sair do papel, senão nós discutimos e discutimos nos conselhos e não sai do papel e as pessoas começam a desanimar de participar.
(Continua lendo.)
"III - aprimorar a relação do governo federal com a sociedade civil, respeitando a autonomia das partes;
IV - promover e consolidar a adoção de mecanismos de participação nas políticas e programas de governo federal". Todos descritos no art. 4º de tal decreto anteriormente citado.
Também está assinalado nesse decreto que um dos objetivos centrais do Sistema Nacional de Participação, na verdade, é a publicidade, a rotatividade dos seus membros, porque há conselhos em que os membros estão lá a vida inteira. Ele sai de presidente para secretário, de secretário para membro, de membro para conselho fiscal. O que destaca aqui esse sistema? Que é necessário ter rotatividade, que a pessoa não pode se perpetuar no poder. Destaca também que tem que ser paritário, que a definição das políticas públicas deve sofrer uma consulta prévia à sociedade, que é importante a garantia da diversidade, que tem que haver critérios transparentes de escolha dos seus membros.
Ora, onde há problema em nós, cidadãos brasileiros, exigirmos transparência na escolha dos membros de todos os conselhos?
Falei da rotatividade.
(Continua lendo.)
"VII - publicidade de seus atos."
Conforme o § 1º do art. 10:
"§ 1º A participação dos membros no conselho é considerada prestação de serviço público relevante, não remunerada."[sic]
Então, convido os ouvintes e os telespectadores a analisar todos os artigos. Não fiquem como boca de aluguel reproduzindo coisas sem fazer uma análise. Analisem esse decreto e verão que nele o fundamento central é aquilo que o grande educador Paulo Freire já dizia: conhecimento é poder. E precisamos socializar o poder. Como é que se socializa poder? Permitindo que o cidadão brasileiro participe. E quando as pessoas participam mais da sociedade, elas compreendem melhor a sociedade e elas se constroem como sujeitos.
Portanto, o que está em jogo no fundamento dessa disputa pós-eleitoral é um Congresso Nacional que se fecha mais e diz: "Nós não queremos a participação popular, não queremos fortalecer esses mecanismos. Nós queremos que o cidadão continue trazendo-nos somente as demandas". Ou então nós dizemos para a sociedade o seguinte: "Cidadão, você quer participar? Vá para os conselhos, vá discutir todos os temas sobre os quais tem afinidade e assim construiremos uma democracia verdadeira".
Eu quero manifestar o meu repúdio com essa falácia toda que desinforma, prejudica a construção da democracia e não contribui para a construção de uma cidadania verdadeira.
Esse decreto foi rejeitado na Câmara Federal e agora vai para o Senado onde já está acontecendo um abaixo-assinado on-line da sociedade brasileira, pedindo aos 81 senadores que se manifestem favoráveis.
O questionamento com relação ao decreto também é outra desinformação. "Ah, mas por que não lei e sim decreto?" Porque, em primeiro lugar, esse decreto não busca interferir em nenhuma instância de poder já instituído. Em segundo lugar, não cria nenhum cargo e nenhum orçamento. Ele vem para estimular a participação individual e coletiva de todos os sujeitos da sociedade.
Então, como presidente da comissão de Direitos Humanos, quero dizer que um direito sagrado é o direito à participação. E não vamos aceitar que esse direito à participação esteja restrito somente a alguns. Queremos uma democracia participativa neste país e não somente representativa. O papel que exercemos é fundamental, mas quando temos a capacidade de ter uma lei que diz que os gestores públicos, os parlamentares e o governo, independente de partido, precisam ouvir e considerar aquilo que a sociedade aponta e levar isso para as suas ações, creio que não há nada de perigoso nisso. Ao contrário, a democracia sempre é a melhor forma de governo.
Muito obrigada, sr. presidente!
(SEM REVISÃO DA ORADORA)