Pronunciamento

Ada De Luca - 023ª SESSÃO ORDINÁRIA

Em 01/04/2009
A SRA. DEPUTADA ADA DE LUCA - Sr. presidente, colegas parlamentares, público que nos acompanham pela Rádio Alesc Digital e pela TVAL, assomo à tribuna hoje aqui para falar um pouco do passado.
(Passa a ler.)
"No dia 31 de março, ontem, o golpe militar que desmantelou o país trucidou pessoas e destruiu famílias completou 45 anos. Para muitos foi ontem, para alguns não existiu, mas nós, que vivemos aqueles dias cinzentos, não podemos deixar a história morrer.
O golpe militar foi almejado por grupos que dominavam a economia do país, mas isso atrasou nosso desenvolvimento econômico e social, endividou o país e gerou incontestáveis escândalos.
Quem tem mais de 40 anos e estiver ouvindo-me, com certeza tem conhecimento do capítulo negro que o nosso país viveu. Talvez muitos dos que estão aqui não lembrem porque ainda eram crianças e para uns já caiu no esquecimento: navios que nunca foram construídos, mas foram pagos pela Marinha; empresas públicas eram utilizadas para espionar, delatar e liquidar com a vida do ser humano; nossa rede ferroviária brasileira, que foi totalmente desmantelada; que houve vários enriquecimentos ilícitos.
É gozado, caros colegas, pois sabem quem levou a culpa de tudo isso na época? O chuchu, o chuchu legume era responsabilizado pela inflação descontrolada. É cômico, mas é verdade! Aliás, na época responsabilizavam os maiores absurdos pelos desmandos da ditadura militar.
Mas depois de muita luta dos que acreditavam num país livre, a democracia foi devolvida para nós. Tivemos eleições diretas para governador e prefeito. E aqui na capital, em Santa Catarina, o grande privilegiado de abrir essa fronteira foi o deputado Edison Andrino, eleito prefeito depois do golpe militar pelo PMDB.
Meu pai, Addo Vânio de Aquino Faraco, foi um desses lutadores. Na madrugada do dia 31 ele, que era deputado nesta Casa, foi preso e lá permaneceu por longos meses. Foi um período muito difícil para toda a família e outras tantas várias famílias. Até hoje a minha mãe até espera uma explicação, um pedido de desculpas e o julgamento justo do processo na tal comissão de anistia.
Algumas famílias brasileiras e catarinenses também ainda esperam. E tenho certeza de que todas - assim como a minha família - gostariam de saber mais sobre o próprio processo e sobre os critérios utilizados pela comissão nos tais julgamentos.
O estado brasileiro reconheceu a sua responsabilidade diante da questão dos que foram mortos e dos que desapareceram pela repressão. Mas digo, deputado Sargento Amauri Soares, que ainda falta muito!
Em meio a muitas histórias de dor, de separação, de dúvida, de silêncio, também existem aqueles que se auto-intitulam exilados e agora querem ser vítimas, os que ficaram só algumas horas detidos, os que deram rápidos depoimentos e, mesmo assim, já tiveram seus processos julgados e foram beneficiados por essa comissão.
Tenho acompanhado de perto há muitos anos, tanto pessoalmente quanto pela imprensa, a distribuição dos benefícios a uns poucos privilegiados com pensões e indenizações, algumas milionárias. Porque agora dá status dizer que passaram por esse período negro da nossa história. Muitos não sabem o que foi a ditadura!
Eu mesma, no auge dos meus 15 anos, tive que visitar meu pai na prisão - isso quando era possível -, pois dos oito meses em que esteve preso, durante quatro meses ele ficou incomunicável, uma experiência que não desejo para ninguém.
Recentemente, a Comissão de Anistia esteve em Santa Catarina para um ato nesta Casa e também para julgar alguns processos.
Gostaria também de saber qual a participação efetiva nesta história de muitos que entraram com seus processos e, para minha surpresa, já foram ressarcidos. Qual a história de cada um? Não quero questionar o direito dos outros. Mas gostaria de saber quais foram os critérios para a seleção dos processos que seriam julgados? Quais os critérios para reconhecer o sofrimento de uns e de outros não?
Gostaria, realmente, que esses julgamentos tivessem mais transparência quanto, repito, aos seus critérios, como se espera de um estado democrático. A truculência que passamos não tem borracha que apague nem dinheiro que pague. Eis aí o meu inconformismo e o de muitos outros.
Meu pai, Addo Vânio de Aquino Faraco, que morreu jovem, morreu com esse desgosto, e quantos já morreram assim, com o desgosto de não ter a sua luta reconhecida pelo país.
E este é o meu medo: que as injustiças perdurem. Contra isso eu vou lutar até os últimos dias da minha vida, como sempre lutei, para fazer prevalecer a transparência e a justiça.
O meu mandato faz parte desta luta. Se hoje estou aqui... E a razão de eu ter coragem para entrar na disputa de uma cadeira legislativa foi a frase proferida por meu pai, dentro da UTI: 'Vai minha filha, te candidata, resgata o que a ditadura me usurpou. Eu vou melhorar para te ajudar'. Ele não teve tempo. Assim como a ditadura, a medicina errou e também não conseguiu reparar o erro. De onde ele estiver, estou certa de que me ilumina nessa luta.
Precisamos jogar luz no período de sombras que foi a ditadura e não deixar que essa luz se apague para o reconhecimento dos injustiçados. Para um país que reivindica um novo status no cenário internacional, o estado brasileiro tem que reconhecer as suas responsabilidades em relação à questão dos presos, torturados, desaparecidos e mortos pela repressão. Abrir as informações sobre as violações ocorridas no período ditatorial é uma necessidade eminente.
É, falta muito mesmo! Falta abrir os arquivos das Forças Armadas! Falta encontrar os ossos dos desaparecidos! Falta saber as circunstâncias de suas mortes. Falta julgar muitos processos de pessoas que foram presas injustamente. Falta julgar os responsáveis! Os que perderam seus empregos e tiveram suas vidas mutiladas por um único crime, o crime de pensar diferente.
A consolidação do estado democrático de direito só será possível se a nação tiver coragem de limpar essas feridas."
Muito obrigada!
(SEM REVISÃO DA ORADORA)