Pronunciamento

Jean Kuhlmann - 094ª SESSÃO ORDINÁRIA

Em 27/11/2008
O SR. DEPUTADO JEAN KUHLMANN - Sr. presidente, srs. deputados, não houve condições de preparar para este momento uma linha lógica, um raciocínio lógico do que poderia falar na tribuna.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que não pude participar, deputado Jailson Lima, v.exa. que também é do vale do Itajaí, das duas sessões desta semana, de terça e quarta-feiras, porque estava em Blumenau socorrendo vítimas e levando alimentação para as pessoas que mais precisavam.
Quero dizer também que talvez tudo que eu falasse nesta tribuna, tudo o que dissesse, qualquer parlamentar ou qualquer pessoa que quisesse utilizar esta tribuna para se pronunciar, não conseguiria expressar nem um décimo daquilo que vimos. Tenho certeza de que quem chegou a ver um corpo deitado no chão, sr. presidente, na posição de quem estava chegando ao seu veículo, que estava a cinco metros de distância, para se salvar porque o morro iria desabar - e ele estava justamente deitado no chão, na posição para chegar ao veículo -, talvez a pessoa que tenha vivenciado isso poderia estar aqui contando o que viu. Porque, srs. deputados, o que nós vimos é lastimável!
Deputado Pedro Baldissera, o desastre não foi só onde houve a ação do homem. Eu, que sobrevoei a cidade de Blumenau, e muito, levando alimentação para as comunidades isoladas nesses dois dias, verifiquei que em locais onde o ser humano nunca esteve, onde nunca houve intervenção, onde nunca se abriu uma estrada, onde nunca se construiu uma casa, onde a floresta estava intacta, até lá o morro desabou, até lá o morro cedeu e a floresta caiu, porque o grande problema, além, muitas vezes, da imprudência do ser humano na ocupação do solo, deputado Reno Caramori, é que a própria formação geológica da região causou isso. Além do que, em apenas poucos dias choveu o equivalente a três, quatro meses de chuva!
O que é isso? Nunca vi nada igual na minha vida! E tenho certeza de que ninguém que está aqui jamais viu. Talvez uns poucos que nos estejam assistindo e acompanhando neste momento possam ter visto aquilo que está acontecendo em Blumenau.
Mas eu tenho certeza, sr. presidente, de que a garra daquele povo, a força do povo daquela cidade, que está-se juntando - e não só de Blumenau, mas de todo o vale do Itajaí, de toda Santa Catarina -, vai permitir a recuperação, sim, porque o nosso estado vai voltar a ser a sempre Santa e Bela Catarina. Esse povo maravilhoso vai recuperar tudo.
De toda essa tragédia apenas 100, cento e poucas pessoas vieram a falecer, porque esse desastre poderia ter levado muito mais vidas. É claro que a perda de uma vida não se compara à perda de qualquer bem material.
No final de semana, quando começamos a trabalhar exaustivamente ajudando a abrir vias, a levar alimentação, eu recebi a lição de vida de uma pessoa no sábado dizendo que precisava de um abrigo. E perguntei o que tinha acontecido. Ela então me respondeu: "Eu perdi a minha casa e meu pai perdeu a dele". A pessoa havia perdido a casa dela e o seu pai também, no mesmo local, porque o morro desabou. Perderam tudo! Eu perguntei, então: "Mas perdeste tudo, então?" Ela respondeu: "Não, só perdi 1%, porque 99%, que é a minha vida, ainda está comigo."
Uma pessoa simples, uma educadora, uma pessoa que trabalha atendendo crianças nas creches deu-me essa lição, uma lição de vida para cada catarinense, para cada cidadão brasileiro que hoje puder ajudar, e uma lição para cada deputado que está aqui, porque nós temos obrigação com essa população, com essa comunidade.
E aqui quero dar o meu testemunho de um exemplo de trabalho sério, de trabalho correto, de trabalho feito com humildade, mas com sinceridade. As Forças Armadas, o Exército, a Aeronáutica, e a Defesa Civil no vale do Itajaí, em Blumenau mais especificamente, sr. presidente, onde todos se uniram, têm feito um trabalho extraordinário, mas a população é que tem dado o grande exemplo, deputado Sargento Amauri Soares.
Em determinado momento fiquei responsável por ir aos abrigos verificar se todos estavam sendo atendidos. Foram abertos mais de 50 abrigos em Blumenau. Eu me surpreendi, porque cheguei num abrigo e havia tanta doação da própria comunidade - não do poder público -, que aquele abrigo já estava distribuindo alimentos para outras localidades para não deixar a comida vencer!
A solidariedade desse povo é algo que nunca vi! A solidariedade do catarinense é algo inexplicável. E eu tenho certeza de que cada um de nós pode ser solidário não apenas com a doação de alimentos, com a doação de abrigos, com a doação do que for possível, mas, acima de tudo, com a doação de si próprio para ajudar o próximo.
Hoje estamos trabalhando em Blumenau com vários abrigos. O prefeito João Paulo Kleinübing faz um trabalho, como o próprio coronel do Exército falou, irretocável - declaração do próprio Exército: ele é quem reúne, organiza, determina as funções; cada um recebe uma tarefa que é obrigado a realizar e no dia seguinte tem que trazer cumprida. Além disso, ele cedeu seu gabinete de prefeito para instalar um QG onde as Forças Armadas, a Defesa Civil e todos da cidade estão coordenando o trabalho. De lá se despacha, organiza-se, faz-se todo o processo de forma organizada, de modo que todos possam ajudar, pois cada um tem a sua função.
Agora estamos fazendo um apelo para que as igrejas de Blumenau, seja luterana, assembléia de Deus ou católica, possam assumir o trabalho de cozinha comunitária, ajudando o município a alimentar o seu povo, porque existem abrigos, srs. parlamentares, naquela cidade que irão funcionar, no mínimo, por seis meses, porque existe muita gente que não perdeu a vida, mas que perdeu tudo o que tinha de material, casa, roupa e que foi para o abrigo sem nada.
Há o caso de uma senhora, nós presenciamos, que na hora em que foi retirada do helicóptero do Exército estava suja de lama e pedia, num ato de desespero, para o militar: "Me mata! Me mata, porque a minha família foi embora e tudo o que eu tinha foi com ela". Ela ficou sozinha pedindo ao militar para levá-la embora, porque ela não queria mais viver essa vida. Tinha perdido tudo o que possuía de material e perdido toda a sua família.
Atos de desespero, atos que eu nem sei descrever e tenho a certeza de que quem está vivendo isso nunca mais vai querer viver e jamais, jamais iria querer que qualquer pessoa passasse por isso.
Por isso é que ocupo esta tribuna mais do que para contar os fatos que nós vivemos, mais do que para falar do desespero que observamos - vimos, no momento em que fomos entregar a alimentação numa comunidade, pessoas quase brigarem pela comida, num ato de desespero e de necessidade -, mais do que para relatar esses fatos que todo mundo vê na imprensa, eu queria pedir ao catarinense, ao blumenauense, ao cidadão do vale do Itajaí, àquela pessoa que está passando por dificuldades e a quem está vivendo isso, que seja solidário, que ajude, que lute, que mostre efetivamente a garra e a vontade do povo catarinense, porque não existe povo melhor, com mais garra e mais vontade de ajudar do que o nosso.
Sr. presidente, eu tenho certeza do que estou falando porque eu presenciei a solidariedade e a força do catarinense!
Muito obrigado!
(SEM REVISÃO DO ORADOR)